Na cripta do Santuário do Sagrado Coração de Jesus, em meio aos objetos pessoais e litúrgicos de Padre Reus, um instrumento musical costumava atrair pouca atenção dos visitantes. O violino, que pertenceu ao Servo de Deus e possui mais de 100 anos, está de volta à exposição, restaurado, higienizado, afinado e pronto para uma futura apresentação em missa solene, a ser programada com músicos da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (OSPA).

Interessado em desenho, estenografia (técnica de escrita), e aprendizado de línguas, Padre Reus também teve seu encanto musical  registrado em biografias. Sobre ela, escreveu: “Muitas horas amenas me proporcionou a música e me livrou de muitos vagueios à toa. Serviu também para alegrar a outros, principalmente meus pais e irmãos de casa”.

O reitor do Santuário, Pe. Raimundo Resende, contou que, em vários parágrafos do volumoso Manual de Liturgia escrito por Padre Reus, é mencionada também a importância do canto, sobretudo o gregoriano. O reitor compreende que “para a espiritualidade inaciana, como para todas as outras espiritualidades, sem dúvida, o canto e a música podem ser muito úteis, pois elevam a alma”, tratando-se de áreas que alegraram e despertaram a atenção do próprio Santo Inácio de Loyola.

Sabendo da importância do violino na vida de João Batista Reus, Pe. Resende compartilhou: “Chamou-me a atenção o estado do instrumento. Há uns sete meses fiquei pensando na sua restauração, até que recebi a visita de um senhor colocando-se à disposição para fazê-la. Então firmamos dia e horário para que eu levasse o instrumento e acompanhasse o procedimento”. O jesuíta explicou que decidiu aceitar o processo de restauro pensando na possibilidade de amigos e devotos do Pe. Reus poderem, em alguns momentos, ouvir músicas sacras tiradas do mesmo violino que ele ouviu e tocou.

O restaurador e músico responsável pelo processo é Ricardo Paranhos, morador de Porto Alegre (RS). Aos 75 anos, ele se descreve como detentor de uma “vocação ferrenha para dar vida a violinos”. Com uma coleção pessoal de cerca de 160 violinos, o profissional e sua família são devotos de Padre Reus: “Eu faço orações para o Padre Reus todas as manhãs, pedindo que ele cuide dos meus filhos, dos meus netos e da minha bisneta. Então, já que lhe dou uma boa missão, senti que também tinha o dever de fazer algo por ele”.

Em termos mais técnicos, Ricardo Paranhos informou que não havia muito estrago no violino. O instrumento apresentava alguns pontos de ferrugem e continha um início de rachadura no tampo, resolvida com uma técnica de colagem especial, para que não abrisse mais. Também foi realizada a substituição das cravelhas (peças que afinam e afrouxam as cordas, localizadas na cabeça do violino) de madeira branca para ébano maciço, a retificação do espelho, a troca das crinas – estimadas da década de 1940  –, além da higienização. Além disso, foram feitos um novo cavalete, a troca das cordas e a adição de dois micro afinadores.

Como devoto, Paranhos descreveu a experiência como um privilégio. Mesmo já tendo restaurado Stradivarius, violinos raros de excelente material e qualidade técnica, o trabalho  dessa vez o tocou de forma diferente e a emoção tomou conta. “O grande valor dele é ter pertencido a quem pertenceu […] Eu acordava e lembrava: o violino do Padre Reus está no meu ateliê, perto do meu quarto! De vez em quando eu ia lá, abria o estojo e dava uma olhadinha. Quando estava pronto, levantei as mãos pro céu, pedi licença a ele e dei uma tocada para confirmar se a alma [peça cilíndrica localizada dentro do instrumento] estava intacta, para que tenha uma sonoridade bonita. Isso tudo foi feito com muito jeito”, narrou.

Segundo Pe. Resende, o violino segue em exposição no Santuário e há uma programação, em parceria com a OSPA, para depois da pandemia: uma missa solene em que o instrumento possa ser tocado.  “O senhor Ricardo Paranhos, compôs uma música em homenagem ao Padre Reus e será executada nesta celebração. Assim, seus devotos poderão apreciar o mesmo som que muitas vezes o ajudou a louvar a Deus”.

Ouça um pequeno trecho tocado pelo restaurador Ricardo Paranhos:

Fonte: Jesuítas Brasil